Um pouco de história sobre os BALDIOS
Por regra, a propriedade sobre uma porção de território ou é PRIVADA ou é PÚBLICA.
A propriedade COLETIVA (são exemplo os baldios, os fornos comunitários) teve a sua origem nos povos organizados em tribos, quer na fase recolectora quer quando se sedentariza e desenvolve a atividade agrícola.
Era a organização tribal, ligados por laços de sangue ou de vizinhança, que usufruía dos proveitos da sua terra; o membro da tribo, enquanto fazendo parte integrante do grupo, usufruía de toda a riqueza que a terra produzia.
Quando falamos em terreno privado, o seu dono ganha o direito de dispor e usufruir dessa parcela de território e esse direito é respeitado por todos; esse direito transmite-se por venda ou sucessão hereditária.
A propriedade pública destina-se ao uso de todos e é pertença da autoridade (Estado, Municípios, etc.).
A propriedade coletiva é diferente da propriedade pública, esta é destinada a fins de interesse público e para todos, enquanto a outra é usufruída por uma comunidade.
O nosso sistema jurídico assenta no direito romano e este sistema apenas reconhecia a propriedade privada, a propriedade pública e as coisas que não eram suscetíveis de apropriação eram classificadas como de comuns, são disso exemplo o ar atmosférico, a água dos oceanos.
Embora no direito português não existisse o conceito de propriedade coletiva, a verdade é que a propriedade sempre existiu no nosso país desde o período pré-romano e recrudesceu mais após as invasões bárbaras.
Com a queda do império romano e as invasões bárbaras a economia agrícola do país degradou-se e desorganizou-se, e o povo empobreceu imenso, a atividade mercantil regrediu fruto da insegurança nas deslocações quer por terra quer por mar.
Os abusos sobre os terrenos baldios sempre existiram
O BALDIO constitui uma curiosa realidade socioeconómica que resistiu, com todas as sucessivas vicissitudes por que passou, à apetência pela apropriação da terra.
Ao longo da história, e na nossa história mais recente, há um conflito que teima em persistir:
Por um lado, temos a propriedade coletiva e o seu uso e fruição por uma comunidade que a protege e a quer manter, por outro lado o ESTADO que a pretende enquadrar e delimitar, ora protegendo-a ora extingui-la por decreto.
Dito de outra forma:
Por um lado, Os Baldios, a tradicional utilização e fruição comunal da terra, sem o sentido de domínio/propriedade, apenas com o sentido de uso, enquanto membro da comunidade.
Pelo outro lado, a exploração da terra por uma entidade privada que se apropria por via da força, da influência ou do poder ou pública que se apropria por decreto.
Neste conflito, os baldios – territórios comunitários – estão a perder a contenda, para tal basta atentar no seguinte:
Em 1980 a área baldia situava-se ente os 3.000.000 a 3.500.000 hectares, um terço do território nacional.
Em 1937 esta área baldia foi reduzida para pouco mais de 500.000Ha e em 1974 para cerca de 400.000Ha.
Quanto ao esbulho a que os territórios baldios estão sujeitos ao longo da história, realça-se o que foi legislado pelos Alvarás régios
De 6/12/1603, quando o Monarca critica os poderosos, que costumam andar na governança, de dividir e se apropriarem de áreas baldias.
De 23/07/1766, O Monarca acusa de “praticando estas injustas e lesivas alienações debaixo de pretextos na aparência úteis, e na realidade nocivos ao progresso e aumento da lavoura, à creação dos gados, à subsistência dos Povos”
E no início do séc. XX, ao abrigo do novo regime florestal, grande parte das áreas baldias são expurgadas às suas comunidades e definitivamente reconhecidos pelos serviços do ministério da agricultura como mais próprios para a cultura florestal do que para qualquer outra, serão arborizados pelos corpos administrativos ou pelo Estado segundo planos gerais e projetos devidamente aprovados nos termos destas bases
No ano de 1976, na sequência da revolução de Abril de 1974, dá-se uma mudança de paradigma, e os terrenos que foram pelo Estado fascista retirados às populações são agora devolvidos às comunidades.
Há quem defenda que esta restituição foi muito tardia porque muitos dos aldeões desistiram da atividade agrícola e da vida miserável que levavam e fugiram do campo para a cidade e muitos partiram por esse mundo fora à procura de melhor vida, levando à desertificação das nossas aldeias.
Algumas destas aldeias recuperaram alguma atividade, não por via da atividade agrícola de subsistência, mas por outras formas de vida, que vão do lazer, passando pelo teletrabalho, pelos serviços, mantendo ainda alguma da tradicional atividade ligado ao campo.
A comunidade do GONDRAMAZ é um dos exemplos de aldeia que resistiu e se regenerou, enquanto a aldeia do CADAVAL, quase desapareceu, mas mantém hoje as legítimas expectativas de se afirmar como comunidade e de recuperar a sua própria identidade e atividade.
Os proveitos retirados de uma boa gestão sustentável dos terrenos baldios pela Assembleia de Compartes destas duas comunidades SÃO um dos maiores e melhores contributos para a melhoria das condições de vida destas comunidades.
A Assembleia de Compartes dos Baldios de Gondramaz e Cadaval (ACBGC), formalmente constituída no ano de 2012, apenas foi reconhecida, por decisão judicial transitada em julgado em 2019.
A Entidade que nos antecedeu na gestão desse território, desvinculou-se dos serviços florestais em 08 de outubro de 2015, passando a gestão autónoma a partir de 08 de outubro de 2016. No entanto, nos anos seguintes, não adotou as melhores práticas na defesa do património florestal dos nossos Baldios, daí a floresta se encontrar com graves problemas fitossanitários e a necessitar urgentemente de intervenção.